Jardim sem Muro uma colect nea de dezanove contos. As personagens baseiam-se nalguns dos tipos da sociedade portuguesa actual, aparecendo vendedores de autom veis em segunda m o, comerciantes de tintas e vernizes, empreiteiros, serralheiros, canalizadores, carpinteiros, electricistas, professores do ensino secund rio, funcion rios das Finan as, estudantes de Psicologia, reformados, emigrantes, agentes de seguran a, viciados na Internet, coleccionadores de selos e moedas, especialistas em ci ncias ocultas, frequentadores de casas de alterne e respectivas funcion rias. Os pol ticos, por evidente falta de utilidade na sociedade, s o das poucas figuras com que o autor n o perdeu tempo nem gastou papel. Os contos, escritos num tom divertido, deixam transparecer o sorriso sarc stico de E a de Queir s e o piscar de olho malandro de David Lodge. Transcreve-se uma passagem:
"Os manuais de jardinagem explicavam que um jardim sem muro era mais propenso ao ataque das ervas daninhas. Com um muro alto, era mais dif cil as sementes disseminarem-se pela a o do vento. Por outro lado, a sombra do muro impedia a prolifera o dessas ervas que, por serem end micas, preferiam o sol. Havia esp cies de plantas ornamentais que se davam bem sombra e os manuais aconselhavam o seu plantio. Nada disto, por m, era exato. Apesar do muro, no jardim do sr. Lindolfo proliferavam os dentes-de-le o, as leitugas, as macelas e os beldros. Enquanto isso, as rosas, as pet nias e os amores-perfeitos, se n o fossem constantemente vigiados, estiolavam. O jardim humano, mesmo assim, era bem mais complexo. Os muros que a sociedade foi construindo para salvaguardar uma pretensa moral iam desabando. Nenhum herbicida, nenhuma monda seria capaz de expurgar os dentes-de-le o da sociedade. Simplesmente porque deixaram de ser considerados ervas daninhas. S o ervas entre outras, com a sua especificidade, as suas caracter sticas pr prias, fruto dos mil caprichos da natureza."